Ela pula para cima de uma cadeira na frente do espelho de maquiagem, e assiste a uma edição preliminar do videoclipe de seu single mais recente, "Alejandro", sem som, em seu MacBook Pro. Levando em conta a inclinação que ela tem para roupas que chamam a atenção, a cena que ela assiste vez após outra é relativamente discreta.
"Está vendo? Não tem telefone nenhum na minha cabeça - nem cabine de telefone", ela diz. Então ela volta o vídeo e dá pausa. "Nem estou usando maquiagem aqui. Sou só eu, e as pessoas vão ver que aquilo que existe por baixo de tudo continua sendo eu." Ela faz uma pausa e saboreia a imagem por mais um instante: "E eu continuo conseguindo ser selvagem".
Claro que, algumas cenas mais para a frente no vídeo, ela está dançando com rifles militares que saem de seus peitos. "Certo, tudo bem, ainda tem um pouco de Lady Gaga ali", ela confessa com um sorriso.
A ex-Stefani Joanne Angelina Germanotta tem uma missão a cumprir: provar que Lady Gaga é arte e que a arte dela não é uma máscara. É a vida dela. E, se ela tivesse menos força de vontade, sua vida estaria saindo fora de controle neste momento: o avô dela está no hospital, o pai passou por cirurgia cardíaca recentemente e ela acabou de ser informada por médicos que corre o risco de desenvolver lúpus, uma doença autoimune que matou uma tia dela, antes mesmo de ela ter nascido.
Adicione a isso pressões de ascensão repentina ao domínio cultural, a ética de trabalho incansável, a turnê mundial aparentemente infindável e o fato de que ela já finalizou demos para o próximo álbum, e é possível imaginar uma estrela à beira do colapso. Mas não é assim que Gaga enxerga as coisas. "Nós deveríamos estar cansados", ela diz antes de cantar algumas das músicas novas que escreveu na estrada. "Não sei quem falou outra coisa, mas você tem que fazer um álbum e uma turnê. É assim que se constrói uma carreira. Eu disse ao meu empresário hoje: 'Estou ansiosa para tirar todos os meus discos de platina das paredes e abrir espaço para mais'."
Apesar de a esperteza e a ambição de Gaga ficarem bem claras, também dá para detectar certa ingenuidade e a disposição de acreditar nas pessoas quando se está cara a cara com ela. Quando seu road manager lhe diz para não mostrar as músicas novas para um jornalista, mesmo que ele concorde em não divulgar, ela ignora o aviso. "Ele vai escrever sobre outras coisas", ela diz. "Só quero que ele saiba quem eu sou."
E quem ela é? Algumas pessoas dizem que Lady Gaga tomou forma no dia em que ela e seu ex-produtor e namorado, Rob Fusari, inventaram o apelido, inspirado pela música "Radio Ga Ga", do Queen. Mas se você acompanhar a história e a música dela com cuidado, vai ver que está mais para o resultado de um coração partido: primeiro pelo pai, um roqueiro bissexto que parou de lhe dar dinheiro quando ela largou a faculdade; e depois pela gravadora Island/ Def Jam, que assinou contrato com ela e então a dispensou, nada impressionada com o rock de pianinho, ao estilo Fiona Apple que ela estava gravando na época, e, finalmente, o ingrediente mais devastador de todos, por uma relação tempestuosa e passional com um baterista de heavy metal, o único namorado que ela diz ter amado, logo antes de ficar famosa.
Depois que os dois terminaram, ela prometeu a si mesma que nunca mais amaria e faria com que ele amaldiçoasse o dia em que duvidou dela. E essa pode ser a origem de sua transformação de Stefani para Gaga. Como qualquer pessoa que a viu durante a turnê sabe - neste momento, isso significa cerca de 1,4 milhão de pessoas -, o show dela não é só um espetáculo de palco como o de Madonna ou do Kiss. É um exemplo de performance de arte altamente pessoal, fantasiada de espetáculo pop. Como ela repete vez após outra durante o show, ela é uma "free bitch" algo como uma "louca livre") e o público deve agir da mesma maneira: libertar-se não apenas das pressões da sociedade para se adaptar mas também do poder dos homens em sua vida, que tentam controlá-lo ou defini-lo. Ela vê seu público como uma coleção de miniversões de seu próprio eu rejeitado do ponto de vista social e romântico e, a certa altura, diz: "Vamos fazer um brinde para curar todos os corações partidos dos meus amigos fodidos". O sucesso dela é a vingança máxima dos deslocados.
Na noite seguinte em Birmingham, Lady Gaga está de novo no backstage, preparando-se para o show. Desta vez, está escutando Born to Run, de Bruce Springsteen, em vinil, usando uma bandana azul como homenagem na cabeça e um colete preto com tachas sem abotoar com um sutiã preto por baixo.
Quando ela usa palavras como "ousadia" ou descreve suas conquistas sexuais de homens bonitos, dá para ver por que os boatos de hermafroditismo a respeito dela são tão persistentes: às vezes, ela parece um homem gay preso em um corpo de mulher. Ela se senta calmamente no sofá, abaixa o volume e reflete sobre a noção de que Lady Gaga seja o produto derivado de um coração partido.
Eu tenho uma teoria sobre você.
Pode falar. Quer que eu me deite?
Talvez seja necessário.
Não temos sofás suficientes para eu deitar.
Você já fez terapia?
Não. Já falei com guias espirituais e coisas assim. Tenho pavor de terapia porque não quero estragar a minha criatividade.
Então, a pergunta é a seguinte: Você acha que se nunca tivesse se decepcionado com aquele cara com quem namorava há cinco anos, não teria tido tanto sucesso quanto teve depois?
Não, não teria. Não. Eu não faria tanto sucesso assim sem ele.
Então, o que eu pensei foi o seguinte...
Você me fez chorar [enxuga as lágrimas].
Você acha que todo o amor que você direcionou aos homens agora, em vez disso, vai para os seus fãs?
Bom, eu realmente nunca amei ninguém como o amei. Ou como o amo. Aquela relação realmente me deu forma. Ela me transformou em lutadora. Mas eu não diria que o meu amor para os meus fãs equivale à minha atenção aos homens. Mas vou dizer que o amor aparece em muitas formas diferentes. E eu meio que decidi que, se você não pode ficar com o homem dos seus sonhos, existem outras maneiras de dar amor. Então, você meio que está certo.
Ele entrou em contato com você depois que você ficou famosa?
Não quero falar sobre ele.
Tudo bem.
Desculpe. Eu quero, mas ele é precioso demais para eu ficar falando.
Estou surpreso. Achei que você já teria superado isso a esta altura.
Ah, eu adoro os meus amigos e o meu passado, e foi isso que fez quem eu sou. Tipo, eu não acorde simplesmente um dia e esqueci como cheguei aqui. Aliás, sempre vou ter um salto alto em Nova York. Eu moro em Hollywood, mas não dá para me fazer amar Hollywood. Eu nunca vou amar Hollywood.
Você acha que, com aquele cara, era obsessão amorosa?
Amor. Mas, sabe como é. Na verdade, eu não sei muita coisa a respeito de amor. Suponho que, se eu soubesse tudo sobre amor, não seria boa em fazer música, não é mesmo?
Não sei. Alguns artistas fazem suas melhores músicas quando estão apaixonados.
Mas eu tenho pavor de bebês.
Por quê?
Acho que, do ponto de vista criativo, como mulher, você muda quando dá à luz. Eu não estou pronta para isso, de jeito algum.
Você ainda se ressente do seu pai por ele ter parado de ajudar você na sua época mais louca?
Eu só me curei, de certa maneira, há pouco tempo, porque o meu pai fez uma cirurgia cardíaca que já devia ter feito desde quando eu era pequena. O medo de perder o homem dos meus sonhos, como o meu pai - pronto, tem uma porra de Freud para você aqui -, foi apavorante. O maior medo da minha vida passou.
Você alguma vez se sente como se estivesse realizando as ambições não concretizadas de estrela do rock do seu pai?
Claro que sim. Eu amo o meu papaizinho. O meu pai é tudo. Espero poder encontrar um homem que me trate tão bem quanto o meu pai.
Você geralmente se apaixona por uns músicos sujinhos, e o seu pai é músico. Então...
É doideira.
Esta é uma palavra interessante para você escolher.
O apelido que o meu pai deu para mim é "Loopy" [doida]. Loops! O meu pai é tão engraçado... Ele me ligou outro dia e ficou tipo assim: "Estou bêbado, e estou deprimido pra caralho, de verdade, porque o meu pai está doente. Que saco". E eu disse: "Sabe, pai, faz parte da vida, e eu sinto muito, mas pode contar comigo". E ele disse: "Você tem razão, Loops, faz parte da vida". Durante toda a minha vida, meu pai ficou tentando esconder de mim que era um cara de verdade, e agora que eu tenho idade suficiente, somos os melhores amigos,
porque ele simplesmente parou de tentar ser o pai.
Ele provavelmente pensou: "Eu tentei mudá-la, mas não tem como". Então ele simplesmente teve que aceitar que você vai ser quem você vai ser.
Bom, por acaso você acabou de reunir todas as relações que eu já tive na vida ou o quê?
Dizem que as pessoas que trabalham muito são assim porque é um vício e, portanto, uma maneira de evitar outras coisas.
De tantas maneiras, minha música também me cura. Então, é heroína, e eu preciso de uma dose para me sentir melhor? Ou será que a música cura? Acho que essa é a grande questão. Quando alguém trabalha tanto quanto eu ou limita sua vida a algo como música ou arte ou escrita, é preciso assumir um compromisso com essa luta e assumir um compromisso com a dor. E eu assumo compromisso com o meu coração partido de corpo e alma. É algo de que eu nunca vou abrir mão. Mas esse coração partido, de certa maneira, é a minha característica. É uma representação do processo do meu trabalho. Na posição de artistas, vivemos eternamente com o coração partido.
Eu não queria entrar em um assunto tão profundo assim tão cedo...
Eu sou mais profunda do que você pensa [risos]. E nós nem conversamos sobre a minha fantasia maluca preferida.
Então, você acha que trabalhar demais é uma maneira de evitar a intimidade e a vulnerabilidade que vem junto com isso?
Bom, o sexo certamente não é, tipo, uma prioridade neste momento. Sexo é diferente de intimidade. Acho que eu considero sexo e intimidade a mesma coisa. Mas estou em um ponto diferente da vida agora, depois de dois anos. Então, acho que agora eu sou mulher.
O que você quer dizer exatamente?
Não sei quando ou por que a g ente percebe que se tornou mulher, mas eu sou mulher. Eu penso diferente. Eu sinto diferente. E me importo cada vez menos com o que as pessoas passam, na medida em que as horas passam. Eu me sinto muito forte.
Existe alguém com quem você é capaz de se abrir e mostrar suas vulnerabilidades?
Bom, existem pouquíssimas pessoas com quem eu posso fazer isso. Faço isso com os meus fãs. Quer dizer, ontem à noite, no palco, eu contei para eles que o meu avô está doente. Mas existem algumas coisas que eu mantenho sagradas. Na posição de alguém que com- pôs dois álbuns sobre isso, tenho o direito de escolher se vou ou não ser uma celebridade, e não quero ser. E sinto que sou relativamente inteligente o suficiente para controlar o fato de as pessoas prestarem mais atenção à minha música e à minha roupa do que à minha vida pessoal. Pode acreditar, eu prefiro mil vezes que as pessoas escrevam a respeito do que eu canto e do que eu faço nos meus videoclipes a escreverem sobre a pessoa com quem eu estou trepando. Quer dizer, isso, para mim, é o fim da picada.
Você acha que está sacrificando certas partes de si mesma e da sua vida pela sua arte e pela sua carreira?
Mas isso é bom, de certa maneira, para mim, não é? Afinal, e s e nós quisermos sair? Não vamos contar para ninguém. E vamos mentir até não poder mais, dizendo que não estamos juntos. E se você disser algo como: "Por que você não quer que as pessoas saibam?", então eu vou saber que você está comigo pelos motivos errados, então eu vou dizer, tipo: "Cai fora".
Mas é claro que quanto mais se tenta esconder...
Acho que o que eu estou tentando dizer é que, para mim, isto aqui é showbiz. Pode não ser showbiz para o resto das pessoas, mas, para mim, é showbiz. Se algum dia, Deus me livre, eu me machucar no palco e os meus fãs ficarem berrando na porta do hospital, esperando até eu sair, eu vou sair como Gaga. Eu não sairia de calça de moletom porque quebrei a perna ou qualquer outra coisa. E foi o que Michael [Jackson] fez. Michael se queimou, e ele ergueu aquela luva de lantejoula tão alto para que os fãs pudessem vê-lo, porque ele estava na arte do show business. É isso que a g ente faz. Algumas pessoas não agem assim. Elas querem se relacionar de um jeito diferente. Eu não quero que as pessoas vejam que eu sou um ser humano. Eu n em bebo água no palco, na frente de ninguém, porque e u quero que eles s e concentrem na fantasia da música e sejam transportados de onde estão para algum outro lugar. As pessoas não são capazes de fazer isso se você simplesmente estiver na Terra. Precisamos ir para o céu.
Você percebe que todas as músicas que está escrevendo para o novo álbum têm um certo tema?
Têm, sim, é a maneira como eu trabalho. Sempre faço álbuns conceituais. Eu meio que me prendo espiritualmente a alguma coisa, e daí tudo cresce a partir dessa semente única. Mas eu não quero falar muito, porque, na verdade, só vai sair no ano que vem, e eu vou anunciar o título do álbum à meia-noite do Ano-Novo. E ninguém sabe disso, então você pode publicar.
Obrigado.
Acho que eu simplesmente vou mandar tatuar o nome do álbum no meu corpo e divulgar a foto. Já faz meses que estou trabalhando nele, e a gora estou sentindo mesmo que está terminado. Veio muito rápido. Alguns artistas demoram anos; eu, não. Escrevo música todos os anos. Quero muito tocar uma coisa para você. Desligue o gravador por um segundo.[O gravador é desligado, e ela canta a faixa-título do disco novo.] Esse refrão, tipo, veio para mim, juro, eu nem escrevi. Acho que Deus jogou no meu colo. E juro que agora, quando eu escrevo música, sinto uma urgência de proteger e cuidar dos meus fãs.
Alguma parte foi escrita sob a influência de ecstasy?
Não. Eu adoro ecstasy. Mas não uso muito. Bom, eu gosto de MDMA. Não gosto de ecstasy.
Os seus fãs parecem gostar de verdade do que você representa, porque algumas pessoas precisam ser lembradas de que não há problema em ser diferente.
Eu adoro aquilo que eles representam. Eles me inspiram a ser mais confiante a cada dia. Quando eu acordo de manhã, eu me sinto como qualquer outra garota insegura de 24 anos. Daí eu digo: "Sua louca, você é a Lady Gaga, pode se levantar, porra, e caminhar de cabeça erguida hoje!", porque eles precisam disso de mim. E eles me inspiram a seguir em frente.
É frustrante ter um álbum novo pronto e ainda estar fazendo turnê e tocando o antigo?
Eu adoro compor na estrada, porque eu me apresento toda noite, e enquanto eu estou no palco interpretando as músicas antigas, eu literalmente imagino que eles estão cantando a letra das minhas músicas novas. Se eu não conseguir imaginar o público cantando as letras, por que então escrever a canção? Para quê? Para preencher alguma porra de terapia na minha alma?
Mas e "Speechless"? Parece uma canção terapêutica.
Eu escrevi essa música para acalmar o meu espírito, mas ninguém dá a mínima para o fato de o refrão não ser bom. Não quero parecer grosseira, mas é assim que eu vejo a música. Nem todo mundo se incomo- da com a porra da sua vida pessoal. A música é uma mentira. A arte é u ma mentira. Você precisa contar uma mentira tão maravilhosa que os seus fãs a trans- formam em verdade. Essa tem sido a minha motivação e a minha inspiração há um tempão, e o álbum novo é uma mentira que eu quero desesperadamente que se transforme em verdade.
Você acha que existe um lado seu que a força a ser forte pelos fãs, a ser um exemplo de pessoa que não tem medos?
Às vezes, não. Às vezes eu desmorono e choro no palco. Eu ando com o c oração totalmente à flor da pele.
Quando você fala de maneira muito ardente de sexo ou quando se veste deixando muita pele aparecer, tem um tipo de uma forma de...
Rebeldia?
Não, não é rebeldia. É uma forma de controle social. É como dizer: "Eu meio que não me sinto à vontade do ponto de vista social, e vou deixar você menos à vontade para que assim eu me sinta mais à vontade".
Ah, entendi o que você quer dizer. Eu gostaria de poder dizer que sim, porque essa é uma análise interessante, mas eu simplesmente me sinto à vontade de verdade naqueles momentos. Eu sou uma pessoa bastante esquizofrênica. Vamos dar nome aos bois, certo? Mas eu me sinto bem com isso, e reconheço o fato. É mesmo muito interessante para mim, porque eu lanço videoclipes, e me apresento ao vivo, e fico chocada com a maneira como as pessoas reagem 79% do tempo, porque eu realmente não acho que seja algo assim tão inovador ou chocante. Acho que é só o meu jeito e quem eu sou, e eu sou feminista.
É interessante conversar com você, porque você tem um lado intelectual e artístico, mas a metade dos seus hits fala sobre cair na balada e encher a cara...
Bom, agora eu tenho um pouco mais de oportunidade de ser assim, não tenho? Não quero falar de maneira arrogante a respeito da minha estratégia musical como artista pop no sentido warholiano, mas hoje é necessário quase dar um truque para fazer as pessoas escutarem alguma coisa inteligente.
Então, o que você pensa é o seguinte: "Vou dar um truque e fazer você engolir isto aqui"?
Ou seduzir as pessoas para se interessarem por algo que é desconfortável. Por que ainda estamos falando de "Don't ask, don't tell" [Não pergunte, não fale; uma política do exército norte-americano que institui que os oficiais não perguntem sobre a opção sexual dos sol- dados]? Porra, em que ano estamos? Isso me deixa louca! E faz três anos que eu estou assando bolos - e agora eu vou assar um bolo que tem uma geleia amarga.
Elabore essa metáfora um pouco.
A mensagem das músicas novas agora é u m pouco mais amarga do que era antes. Porque, quanto mais doce o bolo, mais amarga a geleia pode ser. Se eu tivesse me mostrado como eu sou desde o início, ninguém estaria escutando. A gora as pessoas estão escutando. Então eu posso servir de inspiração, e estou em um ponto diferente da vida. Estou interessada em coisas diferentes. Agora eu tenho fama. Então não quero mais escrever sobre isso.
(Quinze minutos antes da apresentação daquela noite, Lady Gaga pede para continuar a entrevista depois. Logo que o show termina,ela sai apressada do palco para o ônibus de turnê, coberta de sangue falso. Quando o ônibus sai sacolejando do estacionamento de trás do palco, ela ouve gritos do lado de fora, então berra para o motorista: "Espere, pode parar o ônibus? Só vou dar um oi para os meus fãs". Os seguranças dela fazem cara de quem não gostou nada, mas cedem. Ela vai até a porta do ônibus e a abre,e centenas de fãs se apertam em sua direção. Os seguranças começam a berrar para o motorista fechar a porta, e o ônibus vai embora.Ela sorri, feliz, quando retorna para o fundo para continuar a entrevista enquanto o tour manager lhe serve vinho branco e palitinhos de frango, que ela enche de ketchup.)
Como você acha que desenvolveu os recursos para ser capaz de lidar com a fama e crescer junto com ela?
Acho que é a minha família. Acho que são as amizades que eu construí e que são fortes e maravilhosas. A minha melhor amiga da escola - e os amigos que eu fiz em Nova York, quando eles me receberam de braços abertos na sociedade de garotos esquisitos que acabam se unindo. Aliás, eu estava conversando com [a artista performática e colaboradora] Lady Starlight hoje e disse: "Sem vocês, eu não estaria onde estou hoje, com certeza". Eles me deram uma noção de pertencer a algum lugar. Vou começar a chorar só de falar nisso, porque quando sentimos de verdade que não mos encaixamos em lugar nenhum, a fazemos qualquer coisa só para ter uma porra de um amigo. E, quando eu conheci as pessoas certas, elas realmente me deram apoio. Eu nunca vou me esquecer do dia em que ela virou para mim e disse: "Você é uma artista performática". Eu fiquei, tipo: "Você acha mesmo?" Quando as pessoas acreditam em você, você tem a possibilidade de crescer.
Eu reparo que as pessoas que são criadas em lares estáveis, com pais que elas sabem que as amam, conseguem lidar melhor com o sucesso.
Ah, sim! Mas eu fui uma menina má. Eu tinha muitos problemas em casa, quando estava no ensino médio principalmente. Eu era uma porra de um pesadelo. A minha mãe agora vive dando risada de mim, porque eu fico bêbada quando estou em casa com os meus pais no bar da esquina. Eu fico, tipo: "Eu fui uma filha tão péssima, desculpem!" Eu fico tão preocupada. A minha mãe fala, tipo: "Você é assim, não faz mal".
Tem muita coisa no seu comportamento que indica uma experiência traumática na adolescência ou na infância. Você falaria sobre isso publicamente?
Provavelmente não.
Quando Christina Aguilera começou a falar sobre as questões obscuras do passado dela - a infância com violência doméstica -, não houve nenhuma reação negativa, e a experiência acabou servindo como informação ao trabalho dela.
[Hesita] Eu acredito que eu conte esta história à minha própria maneira, e que os meus fãs saibam quem eu sou de verdade. Não quero ensinar a eles as coisas erradas. E a gente também tem de tomar cuidado em relação ao quanto revela às pessoas que gostam tanto assim de nós. Eles sabem quem eu sou. Eles sabem como podem se relacionar comigo. Eu abri o jogo. E se forem tão inteligentes quanto você, tiram as suas conclusões, mas eu não quero ser um mau exemplo.
Um mau exemplo no sentido de ser vítima?
É, e eu não sou vítima. E a minha mensagem é positiva. O meu show tem uma certa ingenuidade e melancolia adorável. Essa é a minha arte. Se eu contasse aquela outra história desse jeito, não sei se seria a melhor maneira que eu teria de ajudar o universo.
Porque, se você falasse sobre isso, as coisas seriam mal interpretadas e enxergadas nessa experiência?
É. Talvez, se eu estivesse escrevendo o meu próprio livro ou algo assim. Acho que é difícil... se eu disser uma coisa na nossa entrevista agora, vai estar no mundo inteiro no dia em que a revista chegar à banca. E tudo seria distorcido e revirado. E a gente precisa honrar certas coisas. Algumas coisas são sagradas.
Entendi.
Existem algumas coisas tão traumáticas que eu nem me lembro delas completamente. Mas vou dizer do fundo do coração que eu tive a mãe e o pai mais maravilhosos do mundo. Nunca sofri violência. Não tive uma infância ruim. Todas as coisas por que eu passei foram relativas à minha própria busca por uma jornada artística para me foder como Warhol e Bowie e Mick, e eu simplesmente fui atrás.
É interessante você ter essa ideia de que o artista precisa se expor a esses lados negros da vida.
Precisa, sim, m as todo o trauma que eu causei a mim mesma... [pausa]. Ou foi causado por pessoas que conheci quando agia de maneira ultrajante e irresponsável. O que eu estou tentando dizer é que, dentro dos limites da moderação, eu gosto de respeitar o fato de que eu não sou Mick Jagger nem David Bowie, e que eu não tenho só fãs de certa idade. Há crianças de uns 9 anos ouvindo a minha música, então eu acho que tento ser respeitosa com elas sempre que é possível.
Você fala de pau e buceta o tempo todo, mas eu entendo o que você quer dizer.
Falo, mas falar de pau e buceta não é o mesmo que as coisas sobre as quais eu poderia falar.
Parece que você se tornou mais religiosa ou espiritual no decorrer do ano passado.
Tive algumas experiências diferentes. Estou muito conectada à minha tia Joanne, e ela não está mais conosco. E , depois, teve a cirurgia do meu pai. E , também, a minha vida mudou muito. É difícil não acreditar que Deus não cuidou de mim quando tive tantos obstáculos como drogas e rejeição e com pessoas que não a creditavam em mim. Tem sido uma estrada longa e contínua, mas é difícil atribuir tudo só a mim mesma. Preciso acreditar que existe algo maior do que eu.
Como uma força superior?
É, uma força superior que cuida de mim. Às vezes eu fico apavorada de verdade - ou, devo dizer, fico petrificada. Quando lembro de estar no meu apartamento [de Nova York] com picadas de percevejo e baratas pelo chão e espelhos com cocaína por todos os lados e nenhuma vontade ou interesse de fazer qualquer outra coisa além de compor música e me drogar. Então acho que percorri um caminho longo de verdade, e tenho meus amigos a agradecer por isso, e tenho Deus.
Então, você acha que se viciar em trabalho substituiu as drogas na sua vida?
A gente simplesmente a prende a colocar a energia em alguma coisa criativa e maravilhosa. Eu trabalho com Deepak Chopra, e liguei para ele e contei um sonho maluco que eu tinha tido... Não quero falar. É mórbido demais.
Você parece ser uma pessoa que tem sonhos mórbidos.
Eu tenho mesmo sonhos mórbidos. Mas eu os coloco no show. Muito do trabalho que eu faço é u m exorcismo para os fãs, mas também para mim mesma. A parte [em vídeo] do show em que eu como o coração é um coração bovino de verdade.
O que a levou a fazer isso?
O meu pai estava para fazer a cirurgia ou talvez tivesse acabado de fazer. Então, Nick Knight, que fez todos os efeitos visuais para os shows, disse para mim: "Está na hora de você deixar isto para trás". E ele me deu o coração como uma maneira de enfrentar o meu medo.
Então, você estava dizendo que procurou Deepak Chopra com o seu sonho. O que aconteceu?
Ah, certo. Eu estava entrando em pânico. Chorava histérica antes do show, tipo: "O diabo está tentando me pegar, Deepak. Eu sou uma boa menina!" Não sei se eu realmente acredito nessas coisas. Acho que só estava preocupada com o meu pai. E Deepak disse: "Você é tão criativa, minha Gaga. De- via transformar isso em um vídeo". E acho que, à sua própria maneira, ele conversou comigo sobre a prender a respeitar e honrar a minha insanidade. É parte de quem sou.
Você tem sonhos recorrentes?
[Hesita] Tenho um sonho re- corrente às vezes em que há um espectro na minha casa. E ele me leva para um quarto, e tem uma menina loira com cordas a marradas nos braços e nas pernas. E ela está usando os meus sapatos do Grammy. Vai entender - louca. E as cordas a estão despedaçando.
Eu nunca vejo quando ela se despedaça, mas fico lá olhando enquanto ela geme, e daí o espectro me diz: " Se você quiser que eu pare de fazê-la sofrer e s e você quiser que a sua família fique bem, você vai cortar o pulso". E acho que ele tem um aparelho maluco próprio para cortar o pulso. E daí ele tem mel, tipo, em um Tupperware, e parece molho agridoce com glutamato. É simplesmente bizarro. E ele quer que eu derrame o mel na ferida, e depois coloque creme por cima e uma gaze.
Então eu fui pesquisar sobre o sonho, e não consegui encontrar nada em lugar nenhum. E a minha mãe diz: "Por acaso esse não é um ritual dos illumiati?" E eu fiquei, tipo: "Ai, meu Deus!"
Vivem dizendo que você está exausta por se esforçar demais na estrada. Você está em turnê há...
Três a nos. Vai completar quatro quando terminarmos. E daí eu vou lançar um álbum novo. Então, a gente se vê! [Dá uma risada cruel] Já estamos planejando o show.
Você se preocupa com a possibilidade de um tiro sair pela culatra?
De onde?
Ninguém é capaz de prever. Mas quando a gente olha para qualquer pessoa que chega a certo ponto da carreira, de repente uma coisa aleatória acontece e todo mundo se volta contra ela; e daí é claro que em algum momento todo mundo volta a amá-la novamente.
Não estou preocupada com isso.Eu acredito em carma. Eu s ou boa de verdade com as pessoas ao meu redor. Não sei se você fez alguma observação sobre a nossa equipe maravilhosa, mas eu amo todo mundo aqui. A minha assistente é uma das minhas melhores amigas. Eu não sou diva, em nenhum sentido da palavra.
Mas, tirando isso, a mídia adora colocar as pessoas nas alturas só para poder derrubar e colocar nas alturas mais uma vez. Todo mundo passa por isso.
Quer dizer, já tentaram de tudo. Mas ainda não conseguiram. Quando começam a dizer que você tem apêndices extras, você tem que partir do princípio de que são incapazes de destruir você. Tenho arranhões nos braços todos, e dizem que sou viciada em heroína. É por causa das minhas fantasias. Quando eu desmaio no palco, dizem que estou me acabando, mas (A) eu tenho os meus próprios problemas de saúde e (B) faz um calor da porra lá e eu ralo toda noite. Ouvi dizer que Audrey Hepburn desmaiava no set o tempo todo, e ninguém dizia que ela estava se acabando.
Quais são os seus problemas de saúde no momento?
Eu não tenho lúpus. Mas tenho a doença no meu sis- tema, e não se sabe muita coisa a respeito dela. Não quero que os meus fãs se preocupem, então não falei sobre o assunto. Mas o negócio é s ó garantir que eu reduza o estresse na minha vida para garantir que eu não desenvolva a doença.
Os médicos lhe deram algum regime para seguir?
É uma doença de família, então eu não escuto muito os médicos quando esse é o assunto, porque é muito pessoal. Converso com pessoas que eu sei que têm a doença, ou com o meu pai, porque a irmã dele morreu disso. Não há nada com que se preocupar, mas às vezes eu fico muito cansada, e naturalmente fico imaginando...
Claro, você se transforma em hipocondríaca.
Não quero ficar assim, então fico a maior parte do tempo pensando: "Caralho, eu estou ótima". Chega a u m ponto em que você passa tanto do ponto de exaustão que não sabe mais: "Será que eu tenho um problema de saúde que pode o u não ser real ou será que só estou cansada de verdade?"
Que mudanças você fez em sua vida quando soube da possibilidade da doença?
Hoje eu me esforço bem mais para minimizar o drama do estresse na minha vida. Eu me cuido. Eu bebo, e continuo vivendo a minha vida, mas jamais poderia decepcionar os meus fãs. Eu ia querer morrer se precisasse enfrentar esse obstáculo extra todos os dias para subir ao palco.É completamente apavorante, de modo que eu simplesmente estou muito focada em mente, corpo e espírito. E também em Joanne - acredito que o espírito dela esteja dentro de mim, então, sabe como é,os meus amigos mais próximos me disseram que é só o jeito dela de dar um oizinho.
Essa é uma maneira interessante de pensar sobre a questão.
E tenho a data da morte dela no meu braço. [Mostra passagem em alemão de Cartas a um Jovem Poeta, de Rainer Maria Rilke]
Perto da citação de Rilke?
É. Ela era poetisa e escritora, e acho que acredito de verdade que ela deixou tarefas por cumprir e que trabalha através de mim. Ela era, tipo, uma santa completa. Então talvez esteja vivendo por procuração através de uma pecadora [risos].
Há um monte de vídeos no YouTube de você tocando rock alternativo e clássico. Você alguma vez teve vontade de voltar a isso e fazer algo no estilo de Billy Joel?
Eu escrevi uma música assim para o álbum novo. É boa demais. E é muito pessoal. A música fala sobre a minha tristeza da maneira mais real e honesta possível, e fala sobre como o meu pai sempre foi o meu amigo nos momentos em que eu me senti mais insuportavelmente sozinha. Ele atendia aos meus telefonemas e ficava me ouvindo chorar e f alar da minha tristeza feito uma idiota, e ele dizia: "Sabe, Loop, você vai ficar bem se as suas músicas tocarem no rádio".
(O ônibus de turnê para em um hotel em Birmingham, onde a assistente de Lady Gaga embarca.)
Vou deixar você ir para Manchester. Obrigado pelo seu tempo.
Use as coisas que vão me transformar em lenda. Eu quero ser uma lenda. Será que isso é errado?
Claro que, algumas cenas mais para a frente no vídeo, ela está dançando com rifles militares que saem de seus peitos. "Certo, tudo bem, ainda tem um pouco de Lady Gaga ali", ela confessa com um sorriso.
A ex-Stefani Joanne Angelina Germanotta tem uma missão a cumprir: provar que Lady Gaga é arte e que a arte dela não é uma máscara. É a vida dela. E, se ela tivesse menos força de vontade, sua vida estaria saindo fora de controle neste momento: o avô dela está no hospital, o pai passou por cirurgia cardíaca recentemente e ela acabou de ser informada por médicos que corre o risco de desenvolver lúpus, uma doença autoimune que matou uma tia dela, antes mesmo de ela ter nascido.
Adicione a isso pressões de ascensão repentina ao domínio cultural, a ética de trabalho incansável, a turnê mundial aparentemente infindável e o fato de que ela já finalizou demos para o próximo álbum, e é possível imaginar uma estrela à beira do colapso. Mas não é assim que Gaga enxerga as coisas. "Nós deveríamos estar cansados", ela diz antes de cantar algumas das músicas novas que escreveu na estrada. "Não sei quem falou outra coisa, mas você tem que fazer um álbum e uma turnê. É assim que se constrói uma carreira. Eu disse ao meu empresário hoje: 'Estou ansiosa para tirar todos os meus discos de platina das paredes e abrir espaço para mais'."
Apesar de a esperteza e a ambição de Gaga ficarem bem claras, também dá para detectar certa ingenuidade e a disposição de acreditar nas pessoas quando se está cara a cara com ela. Quando seu road manager lhe diz para não mostrar as músicas novas para um jornalista, mesmo que ele concorde em não divulgar, ela ignora o aviso. "Ele vai escrever sobre outras coisas", ela diz. "Só quero que ele saiba quem eu sou."
E quem ela é? Algumas pessoas dizem que Lady Gaga tomou forma no dia em que ela e seu ex-produtor e namorado, Rob Fusari, inventaram o apelido, inspirado pela música "Radio Ga Ga", do Queen. Mas se você acompanhar a história e a música dela com cuidado, vai ver que está mais para o resultado de um coração partido: primeiro pelo pai, um roqueiro bissexto que parou de lhe dar dinheiro quando ela largou a faculdade; e depois pela gravadora Island/ Def Jam, que assinou contrato com ela e então a dispensou, nada impressionada com o rock de pianinho, ao estilo Fiona Apple que ela estava gravando na época, e, finalmente, o ingrediente mais devastador de todos, por uma relação tempestuosa e passional com um baterista de heavy metal, o único namorado que ela diz ter amado, logo antes de ficar famosa.
Depois que os dois terminaram, ela prometeu a si mesma que nunca mais amaria e faria com que ele amaldiçoasse o dia em que duvidou dela. E essa pode ser a origem de sua transformação de Stefani para Gaga. Como qualquer pessoa que a viu durante a turnê sabe - neste momento, isso significa cerca de 1,4 milhão de pessoas -, o show dela não é só um espetáculo de palco como o de Madonna ou do Kiss. É um exemplo de performance de arte altamente pessoal, fantasiada de espetáculo pop. Como ela repete vez após outra durante o show, ela é uma "free bitch" algo como uma "louca livre") e o público deve agir da mesma maneira: libertar-se não apenas das pressões da sociedade para se adaptar mas também do poder dos homens em sua vida, que tentam controlá-lo ou defini-lo. Ela vê seu público como uma coleção de miniversões de seu próprio eu rejeitado do ponto de vista social e romântico e, a certa altura, diz: "Vamos fazer um brinde para curar todos os corações partidos dos meus amigos fodidos". O sucesso dela é a vingança máxima dos deslocados.
Na noite seguinte em Birmingham, Lady Gaga está de novo no backstage, preparando-se para o show. Desta vez, está escutando Born to Run, de Bruce Springsteen, em vinil, usando uma bandana azul como homenagem na cabeça e um colete preto com tachas sem abotoar com um sutiã preto por baixo.
Quando ela usa palavras como "ousadia" ou descreve suas conquistas sexuais de homens bonitos, dá para ver por que os boatos de hermafroditismo a respeito dela são tão persistentes: às vezes, ela parece um homem gay preso em um corpo de mulher. Ela se senta calmamente no sofá, abaixa o volume e reflete sobre a noção de que Lady Gaga seja o produto derivado de um coração partido.
Eu tenho uma teoria sobre você.
Pode falar. Quer que eu me deite?
Talvez seja necessário.
Não temos sofás suficientes para eu deitar.
Você já fez terapia?
Não. Já falei com guias espirituais e coisas assim. Tenho pavor de terapia porque não quero estragar a minha criatividade.
Então, a pergunta é a seguinte: Você acha que se nunca tivesse se decepcionado com aquele cara com quem namorava há cinco anos, não teria tido tanto sucesso quanto teve depois?
Não, não teria. Não. Eu não faria tanto sucesso assim sem ele.
Então, o que eu pensei foi o seguinte...
Você me fez chorar [enxuga as lágrimas].
Você acha que todo o amor que você direcionou aos homens agora, em vez disso, vai para os seus fãs?
Bom, eu realmente nunca amei ninguém como o amei. Ou como o amo. Aquela relação realmente me deu forma. Ela me transformou em lutadora. Mas eu não diria que o meu amor para os meus fãs equivale à minha atenção aos homens. Mas vou dizer que o amor aparece em muitas formas diferentes. E eu meio que decidi que, se você não pode ficar com o homem dos seus sonhos, existem outras maneiras de dar amor. Então, você meio que está certo.
Ele entrou em contato com você depois que você ficou famosa?
Não quero falar sobre ele.
Tudo bem.
Desculpe. Eu quero, mas ele é precioso demais para eu ficar falando.
Estou surpreso. Achei que você já teria superado isso a esta altura.
Ah, eu adoro os meus amigos e o meu passado, e foi isso que fez quem eu sou. Tipo, eu não acorde simplesmente um dia e esqueci como cheguei aqui. Aliás, sempre vou ter um salto alto em Nova York. Eu moro em Hollywood, mas não dá para me fazer amar Hollywood. Eu nunca vou amar Hollywood.
Você acha que, com aquele cara, era obsessão amorosa?
Amor. Mas, sabe como é. Na verdade, eu não sei muita coisa a respeito de amor. Suponho que, se eu soubesse tudo sobre amor, não seria boa em fazer música, não é mesmo?
Não sei. Alguns artistas fazem suas melhores músicas quando estão apaixonados.
Mas eu tenho pavor de bebês.
Por quê?
Acho que, do ponto de vista criativo, como mulher, você muda quando dá à luz. Eu não estou pronta para isso, de jeito algum.
Você ainda se ressente do seu pai por ele ter parado de ajudar você na sua época mais louca?
Eu só me curei, de certa maneira, há pouco tempo, porque o meu pai fez uma cirurgia cardíaca que já devia ter feito desde quando eu era pequena. O medo de perder o homem dos meus sonhos, como o meu pai - pronto, tem uma porra de Freud para você aqui -, foi apavorante. O maior medo da minha vida passou.
Você alguma vez se sente como se estivesse realizando as ambições não concretizadas de estrela do rock do seu pai?
Claro que sim. Eu amo o meu papaizinho. O meu pai é tudo. Espero poder encontrar um homem que me trate tão bem quanto o meu pai.
Você geralmente se apaixona por uns músicos sujinhos, e o seu pai é músico. Então...
É doideira.
Esta é uma palavra interessante para você escolher.
O apelido que o meu pai deu para mim é "Loopy" [doida]. Loops! O meu pai é tão engraçado... Ele me ligou outro dia e ficou tipo assim: "Estou bêbado, e estou deprimido pra caralho, de verdade, porque o meu pai está doente. Que saco". E eu disse: "Sabe, pai, faz parte da vida, e eu sinto muito, mas pode contar comigo". E ele disse: "Você tem razão, Loops, faz parte da vida". Durante toda a minha vida, meu pai ficou tentando esconder de mim que era um cara de verdade, e agora que eu tenho idade suficiente, somos os melhores amigos,
porque ele simplesmente parou de tentar ser o pai.
Ele provavelmente pensou: "Eu tentei mudá-la, mas não tem como". Então ele simplesmente teve que aceitar que você vai ser quem você vai ser.
Bom, por acaso você acabou de reunir todas as relações que eu já tive na vida ou o quê?
Dizem que as pessoas que trabalham muito são assim porque é um vício e, portanto, uma maneira de evitar outras coisas.
De tantas maneiras, minha música também me cura. Então, é heroína, e eu preciso de uma dose para me sentir melhor? Ou será que a música cura? Acho que essa é a grande questão. Quando alguém trabalha tanto quanto eu ou limita sua vida a algo como música ou arte ou escrita, é preciso assumir um compromisso com essa luta e assumir um compromisso com a dor. E eu assumo compromisso com o meu coração partido de corpo e alma. É algo de que eu nunca vou abrir mão. Mas esse coração partido, de certa maneira, é a minha característica. É uma representação do processo do meu trabalho. Na posição de artistas, vivemos eternamente com o coração partido.
Eu não queria entrar em um assunto tão profundo assim tão cedo...
Eu sou mais profunda do que você pensa [risos]. E nós nem conversamos sobre a minha fantasia maluca preferida.
Então, você acha que trabalhar demais é uma maneira de evitar a intimidade e a vulnerabilidade que vem junto com isso?
Bom, o sexo certamente não é, tipo, uma prioridade neste momento. Sexo é diferente de intimidade. Acho que eu considero sexo e intimidade a mesma coisa. Mas estou em um ponto diferente da vida agora, depois de dois anos. Então, acho que agora eu sou mulher.
O que você quer dizer exatamente?
Não sei quando ou por que a g ente percebe que se tornou mulher, mas eu sou mulher. Eu penso diferente. Eu sinto diferente. E me importo cada vez menos com o que as pessoas passam, na medida em que as horas passam. Eu me sinto muito forte.
Existe alguém com quem você é capaz de se abrir e mostrar suas vulnerabilidades?
Bom, existem pouquíssimas pessoas com quem eu posso fazer isso. Faço isso com os meus fãs. Quer dizer, ontem à noite, no palco, eu contei para eles que o meu avô está doente. Mas existem algumas coisas que eu mantenho sagradas. Na posição de alguém que com- pôs dois álbuns sobre isso, tenho o direito de escolher se vou ou não ser uma celebridade, e não quero ser. E sinto que sou relativamente inteligente o suficiente para controlar o fato de as pessoas prestarem mais atenção à minha música e à minha roupa do que à minha vida pessoal. Pode acreditar, eu prefiro mil vezes que as pessoas escrevam a respeito do que eu canto e do que eu faço nos meus videoclipes a escreverem sobre a pessoa com quem eu estou trepando. Quer dizer, isso, para mim, é o fim da picada.
Você acha que está sacrificando certas partes de si mesma e da sua vida pela sua arte e pela sua carreira?
Mas isso é bom, de certa maneira, para mim, não é? Afinal, e s e nós quisermos sair? Não vamos contar para ninguém. E vamos mentir até não poder mais, dizendo que não estamos juntos. E se você disser algo como: "Por que você não quer que as pessoas saibam?", então eu vou saber que você está comigo pelos motivos errados, então eu vou dizer, tipo: "Cai fora".
Mas é claro que quanto mais se tenta esconder...
Acho que o que eu estou tentando dizer é que, para mim, isto aqui é showbiz. Pode não ser showbiz para o resto das pessoas, mas, para mim, é showbiz. Se algum dia, Deus me livre, eu me machucar no palco e os meus fãs ficarem berrando na porta do hospital, esperando até eu sair, eu vou sair como Gaga. Eu não sairia de calça de moletom porque quebrei a perna ou qualquer outra coisa. E foi o que Michael [Jackson] fez. Michael se queimou, e ele ergueu aquela luva de lantejoula tão alto para que os fãs pudessem vê-lo, porque ele estava na arte do show business. É isso que a g ente faz. Algumas pessoas não agem assim. Elas querem se relacionar de um jeito diferente. Eu não quero que as pessoas vejam que eu sou um ser humano. Eu n em bebo água no palco, na frente de ninguém, porque e u quero que eles s e concentrem na fantasia da música e sejam transportados de onde estão para algum outro lugar. As pessoas não são capazes de fazer isso se você simplesmente estiver na Terra. Precisamos ir para o céu.
Você percebe que todas as músicas que está escrevendo para o novo álbum têm um certo tema?
Têm, sim, é a maneira como eu trabalho. Sempre faço álbuns conceituais. Eu meio que me prendo espiritualmente a alguma coisa, e daí tudo cresce a partir dessa semente única. Mas eu não quero falar muito, porque, na verdade, só vai sair no ano que vem, e eu vou anunciar o título do álbum à meia-noite do Ano-Novo. E ninguém sabe disso, então você pode publicar.
Obrigado.
Acho que eu simplesmente vou mandar tatuar o nome do álbum no meu corpo e divulgar a foto. Já faz meses que estou trabalhando nele, e a gora estou sentindo mesmo que está terminado. Veio muito rápido. Alguns artistas demoram anos; eu, não. Escrevo música todos os anos. Quero muito tocar uma coisa para você. Desligue o gravador por um segundo.[O gravador é desligado, e ela canta a faixa-título do disco novo.] Esse refrão, tipo, veio para mim, juro, eu nem escrevi. Acho que Deus jogou no meu colo. E juro que agora, quando eu escrevo música, sinto uma urgência de proteger e cuidar dos meus fãs.
Alguma parte foi escrita sob a influência de ecstasy?
Não. Eu adoro ecstasy. Mas não uso muito. Bom, eu gosto de MDMA. Não gosto de ecstasy.
Os seus fãs parecem gostar de verdade do que você representa, porque algumas pessoas precisam ser lembradas de que não há problema em ser diferente.
Eu adoro aquilo que eles representam. Eles me inspiram a ser mais confiante a cada dia. Quando eu acordo de manhã, eu me sinto como qualquer outra garota insegura de 24 anos. Daí eu digo: "Sua louca, você é a Lady Gaga, pode se levantar, porra, e caminhar de cabeça erguida hoje!", porque eles precisam disso de mim. E eles me inspiram a seguir em frente.
É frustrante ter um álbum novo pronto e ainda estar fazendo turnê e tocando o antigo?
Eu adoro compor na estrada, porque eu me apresento toda noite, e enquanto eu estou no palco interpretando as músicas antigas, eu literalmente imagino que eles estão cantando a letra das minhas músicas novas. Se eu não conseguir imaginar o público cantando as letras, por que então escrever a canção? Para quê? Para preencher alguma porra de terapia na minha alma?
Mas e "Speechless"? Parece uma canção terapêutica.
Eu escrevi essa música para acalmar o meu espírito, mas ninguém dá a mínima para o fato de o refrão não ser bom. Não quero parecer grosseira, mas é assim que eu vejo a música. Nem todo mundo se incomo- da com a porra da sua vida pessoal. A música é uma mentira. A arte é u ma mentira. Você precisa contar uma mentira tão maravilhosa que os seus fãs a trans- formam em verdade. Essa tem sido a minha motivação e a minha inspiração há um tempão, e o álbum novo é uma mentira que eu quero desesperadamente que se transforme em verdade.
Você acha que existe um lado seu que a força a ser forte pelos fãs, a ser um exemplo de pessoa que não tem medos?
Às vezes, não. Às vezes eu desmorono e choro no palco. Eu ando com o c oração totalmente à flor da pele.
Quando você fala de maneira muito ardente de sexo ou quando se veste deixando muita pele aparecer, tem um tipo de uma forma de...
Rebeldia?
Não, não é rebeldia. É uma forma de controle social. É como dizer: "Eu meio que não me sinto à vontade do ponto de vista social, e vou deixar você menos à vontade para que assim eu me sinta mais à vontade".
Ah, entendi o que você quer dizer. Eu gostaria de poder dizer que sim, porque essa é uma análise interessante, mas eu simplesmente me sinto à vontade de verdade naqueles momentos. Eu sou uma pessoa bastante esquizofrênica. Vamos dar nome aos bois, certo? Mas eu me sinto bem com isso, e reconheço o fato. É mesmo muito interessante para mim, porque eu lanço videoclipes, e me apresento ao vivo, e fico chocada com a maneira como as pessoas reagem 79% do tempo, porque eu realmente não acho que seja algo assim tão inovador ou chocante. Acho que é só o meu jeito e quem eu sou, e eu sou feminista.
É interessante conversar com você, porque você tem um lado intelectual e artístico, mas a metade dos seus hits fala sobre cair na balada e encher a cara...
Bom, agora eu tenho um pouco mais de oportunidade de ser assim, não tenho? Não quero falar de maneira arrogante a respeito da minha estratégia musical como artista pop no sentido warholiano, mas hoje é necessário quase dar um truque para fazer as pessoas escutarem alguma coisa inteligente.
Então, o que você pensa é o seguinte: "Vou dar um truque e fazer você engolir isto aqui"?
Ou seduzir as pessoas para se interessarem por algo que é desconfortável. Por que ainda estamos falando de "Don't ask, don't tell" [Não pergunte, não fale; uma política do exército norte-americano que institui que os oficiais não perguntem sobre a opção sexual dos sol- dados]? Porra, em que ano estamos? Isso me deixa louca! E faz três anos que eu estou assando bolos - e agora eu vou assar um bolo que tem uma geleia amarga.
Elabore essa metáfora um pouco.
A mensagem das músicas novas agora é u m pouco mais amarga do que era antes. Porque, quanto mais doce o bolo, mais amarga a geleia pode ser. Se eu tivesse me mostrado como eu sou desde o início, ninguém estaria escutando. A gora as pessoas estão escutando. Então eu posso servir de inspiração, e estou em um ponto diferente da vida. Estou interessada em coisas diferentes. Agora eu tenho fama. Então não quero mais escrever sobre isso.
(Quinze minutos antes da apresentação daquela noite, Lady Gaga pede para continuar a entrevista depois. Logo que o show termina,ela sai apressada do palco para o ônibus de turnê, coberta de sangue falso. Quando o ônibus sai sacolejando do estacionamento de trás do palco, ela ouve gritos do lado de fora, então berra para o motorista: "Espere, pode parar o ônibus? Só vou dar um oi para os meus fãs". Os seguranças dela fazem cara de quem não gostou nada, mas cedem. Ela vai até a porta do ônibus e a abre,e centenas de fãs se apertam em sua direção. Os seguranças começam a berrar para o motorista fechar a porta, e o ônibus vai embora.Ela sorri, feliz, quando retorna para o fundo para continuar a entrevista enquanto o tour manager lhe serve vinho branco e palitinhos de frango, que ela enche de ketchup.)
Como você acha que desenvolveu os recursos para ser capaz de lidar com a fama e crescer junto com ela?
Acho que é a minha família. Acho que são as amizades que eu construí e que são fortes e maravilhosas. A minha melhor amiga da escola - e os amigos que eu fiz em Nova York, quando eles me receberam de braços abertos na sociedade de garotos esquisitos que acabam se unindo. Aliás, eu estava conversando com [a artista performática e colaboradora] Lady Starlight hoje e disse: "Sem vocês, eu não estaria onde estou hoje, com certeza". Eles me deram uma noção de pertencer a algum lugar. Vou começar a chorar só de falar nisso, porque quando sentimos de verdade que não mos encaixamos em lugar nenhum, a fazemos qualquer coisa só para ter uma porra de um amigo. E, quando eu conheci as pessoas certas, elas realmente me deram apoio. Eu nunca vou me esquecer do dia em que ela virou para mim e disse: "Você é uma artista performática". Eu fiquei, tipo: "Você acha mesmo?" Quando as pessoas acreditam em você, você tem a possibilidade de crescer.
Eu reparo que as pessoas que são criadas em lares estáveis, com pais que elas sabem que as amam, conseguem lidar melhor com o sucesso.
Ah, sim! Mas eu fui uma menina má. Eu tinha muitos problemas em casa, quando estava no ensino médio principalmente. Eu era uma porra de um pesadelo. A minha mãe agora vive dando risada de mim, porque eu fico bêbada quando estou em casa com os meus pais no bar da esquina. Eu fico, tipo: "Eu fui uma filha tão péssima, desculpem!" Eu fico tão preocupada. A minha mãe fala, tipo: "Você é assim, não faz mal".
Tem muita coisa no seu comportamento que indica uma experiência traumática na adolescência ou na infância. Você falaria sobre isso publicamente?
Provavelmente não.
Quando Christina Aguilera começou a falar sobre as questões obscuras do passado dela - a infância com violência doméstica -, não houve nenhuma reação negativa, e a experiência acabou servindo como informação ao trabalho dela.
[Hesita] Eu acredito que eu conte esta história à minha própria maneira, e que os meus fãs saibam quem eu sou de verdade. Não quero ensinar a eles as coisas erradas. E a gente também tem de tomar cuidado em relação ao quanto revela às pessoas que gostam tanto assim de nós. Eles sabem quem eu sou. Eles sabem como podem se relacionar comigo. Eu abri o jogo. E se forem tão inteligentes quanto você, tiram as suas conclusões, mas eu não quero ser um mau exemplo.
Um mau exemplo no sentido de ser vítima?
É, e eu não sou vítima. E a minha mensagem é positiva. O meu show tem uma certa ingenuidade e melancolia adorável. Essa é a minha arte. Se eu contasse aquela outra história desse jeito, não sei se seria a melhor maneira que eu teria de ajudar o universo.
Porque, se você falasse sobre isso, as coisas seriam mal interpretadas e enxergadas nessa experiência?
É. Talvez, se eu estivesse escrevendo o meu próprio livro ou algo assim. Acho que é difícil... se eu disser uma coisa na nossa entrevista agora, vai estar no mundo inteiro no dia em que a revista chegar à banca. E tudo seria distorcido e revirado. E a gente precisa honrar certas coisas. Algumas coisas são sagradas.
Entendi.
Existem algumas coisas tão traumáticas que eu nem me lembro delas completamente. Mas vou dizer do fundo do coração que eu tive a mãe e o pai mais maravilhosos do mundo. Nunca sofri violência. Não tive uma infância ruim. Todas as coisas por que eu passei foram relativas à minha própria busca por uma jornada artística para me foder como Warhol e Bowie e Mick, e eu simplesmente fui atrás.
É interessante você ter essa ideia de que o artista precisa se expor a esses lados negros da vida.
Precisa, sim, m as todo o trauma que eu causei a mim mesma... [pausa]. Ou foi causado por pessoas que conheci quando agia de maneira ultrajante e irresponsável. O que eu estou tentando dizer é que, dentro dos limites da moderação, eu gosto de respeitar o fato de que eu não sou Mick Jagger nem David Bowie, e que eu não tenho só fãs de certa idade. Há crianças de uns 9 anos ouvindo a minha música, então eu acho que tento ser respeitosa com elas sempre que é possível.
Você fala de pau e buceta o tempo todo, mas eu entendo o que você quer dizer.
Falo, mas falar de pau e buceta não é o mesmo que as coisas sobre as quais eu poderia falar.
Parece que você se tornou mais religiosa ou espiritual no decorrer do ano passado.
Tive algumas experiências diferentes. Estou muito conectada à minha tia Joanne, e ela não está mais conosco. E , depois, teve a cirurgia do meu pai. E , também, a minha vida mudou muito. É difícil não acreditar que Deus não cuidou de mim quando tive tantos obstáculos como drogas e rejeição e com pessoas que não a creditavam em mim. Tem sido uma estrada longa e contínua, mas é difícil atribuir tudo só a mim mesma. Preciso acreditar que existe algo maior do que eu.
Como uma força superior?
É, uma força superior que cuida de mim. Às vezes eu fico apavorada de verdade - ou, devo dizer, fico petrificada. Quando lembro de estar no meu apartamento [de Nova York] com picadas de percevejo e baratas pelo chão e espelhos com cocaína por todos os lados e nenhuma vontade ou interesse de fazer qualquer outra coisa além de compor música e me drogar. Então acho que percorri um caminho longo de verdade, e tenho meus amigos a agradecer por isso, e tenho Deus.
Então, você acha que se viciar em trabalho substituiu as drogas na sua vida?
A gente simplesmente a prende a colocar a energia em alguma coisa criativa e maravilhosa. Eu trabalho com Deepak Chopra, e liguei para ele e contei um sonho maluco que eu tinha tido... Não quero falar. É mórbido demais.
Você parece ser uma pessoa que tem sonhos mórbidos.
Eu tenho mesmo sonhos mórbidos. Mas eu os coloco no show. Muito do trabalho que eu faço é u m exorcismo para os fãs, mas também para mim mesma. A parte [em vídeo] do show em que eu como o coração é um coração bovino de verdade.
O que a levou a fazer isso?
O meu pai estava para fazer a cirurgia ou talvez tivesse acabado de fazer. Então, Nick Knight, que fez todos os efeitos visuais para os shows, disse para mim: "Está na hora de você deixar isto para trás". E ele me deu o coração como uma maneira de enfrentar o meu medo.
Então, você estava dizendo que procurou Deepak Chopra com o seu sonho. O que aconteceu?
Ah, certo. Eu estava entrando em pânico. Chorava histérica antes do show, tipo: "O diabo está tentando me pegar, Deepak. Eu sou uma boa menina!" Não sei se eu realmente acredito nessas coisas. Acho que só estava preocupada com o meu pai. E Deepak disse: "Você é tão criativa, minha Gaga. De- via transformar isso em um vídeo". E acho que, à sua própria maneira, ele conversou comigo sobre a prender a respeitar e honrar a minha insanidade. É parte de quem sou.
Você tem sonhos recorrentes?
[Hesita] Tenho um sonho re- corrente às vezes em que há um espectro na minha casa. E ele me leva para um quarto, e tem uma menina loira com cordas a marradas nos braços e nas pernas. E ela está usando os meus sapatos do Grammy. Vai entender - louca. E as cordas a estão despedaçando.
Eu nunca vejo quando ela se despedaça, mas fico lá olhando enquanto ela geme, e daí o espectro me diz: " Se você quiser que eu pare de fazê-la sofrer e s e você quiser que a sua família fique bem, você vai cortar o pulso". E acho que ele tem um aparelho maluco próprio para cortar o pulso. E daí ele tem mel, tipo, em um Tupperware, e parece molho agridoce com glutamato. É simplesmente bizarro. E ele quer que eu derrame o mel na ferida, e depois coloque creme por cima e uma gaze.
Então eu fui pesquisar sobre o sonho, e não consegui encontrar nada em lugar nenhum. E a minha mãe diz: "Por acaso esse não é um ritual dos illumiati?" E eu fiquei, tipo: "Ai, meu Deus!"
Vivem dizendo que você está exausta por se esforçar demais na estrada. Você está em turnê há...
Três a nos. Vai completar quatro quando terminarmos. E daí eu vou lançar um álbum novo. Então, a gente se vê! [Dá uma risada cruel] Já estamos planejando o show.
Você se preocupa com a possibilidade de um tiro sair pela culatra?
De onde?
Ninguém é capaz de prever. Mas quando a gente olha para qualquer pessoa que chega a certo ponto da carreira, de repente uma coisa aleatória acontece e todo mundo se volta contra ela; e daí é claro que em algum momento todo mundo volta a amá-la novamente.
Não estou preocupada com isso.Eu acredito em carma. Eu s ou boa de verdade com as pessoas ao meu redor. Não sei se você fez alguma observação sobre a nossa equipe maravilhosa, mas eu amo todo mundo aqui. A minha assistente é uma das minhas melhores amigas. Eu não sou diva, em nenhum sentido da palavra.
Mas, tirando isso, a mídia adora colocar as pessoas nas alturas só para poder derrubar e colocar nas alturas mais uma vez. Todo mundo passa por isso.
Quer dizer, já tentaram de tudo. Mas ainda não conseguiram. Quando começam a dizer que você tem apêndices extras, você tem que partir do princípio de que são incapazes de destruir você. Tenho arranhões nos braços todos, e dizem que sou viciada em heroína. É por causa das minhas fantasias. Quando eu desmaio no palco, dizem que estou me acabando, mas (A) eu tenho os meus próprios problemas de saúde e (B) faz um calor da porra lá e eu ralo toda noite. Ouvi dizer que Audrey Hepburn desmaiava no set o tempo todo, e ninguém dizia que ela estava se acabando.
Quais são os seus problemas de saúde no momento?
Eu não tenho lúpus. Mas tenho a doença no meu sis- tema, e não se sabe muita coisa a respeito dela. Não quero que os meus fãs se preocupem, então não falei sobre o assunto. Mas o negócio é s ó garantir que eu reduza o estresse na minha vida para garantir que eu não desenvolva a doença.
Os médicos lhe deram algum regime para seguir?
É uma doença de família, então eu não escuto muito os médicos quando esse é o assunto, porque é muito pessoal. Converso com pessoas que eu sei que têm a doença, ou com o meu pai, porque a irmã dele morreu disso. Não há nada com que se preocupar, mas às vezes eu fico muito cansada, e naturalmente fico imaginando...
Claro, você se transforma em hipocondríaca.
Não quero ficar assim, então fico a maior parte do tempo pensando: "Caralho, eu estou ótima". Chega a u m ponto em que você passa tanto do ponto de exaustão que não sabe mais: "Será que eu tenho um problema de saúde que pode o u não ser real ou será que só estou cansada de verdade?"
Que mudanças você fez em sua vida quando soube da possibilidade da doença?
Hoje eu me esforço bem mais para minimizar o drama do estresse na minha vida. Eu me cuido. Eu bebo, e continuo vivendo a minha vida, mas jamais poderia decepcionar os meus fãs. Eu ia querer morrer se precisasse enfrentar esse obstáculo extra todos os dias para subir ao palco.É completamente apavorante, de modo que eu simplesmente estou muito focada em mente, corpo e espírito. E também em Joanne - acredito que o espírito dela esteja dentro de mim, então, sabe como é,os meus amigos mais próximos me disseram que é só o jeito dela de dar um oizinho.
Essa é uma maneira interessante de pensar sobre a questão.
E tenho a data da morte dela no meu braço. [Mostra passagem em alemão de Cartas a um Jovem Poeta, de Rainer Maria Rilke]
Perto da citação de Rilke?
É. Ela era poetisa e escritora, e acho que acredito de verdade que ela deixou tarefas por cumprir e que trabalha através de mim. Ela era, tipo, uma santa completa. Então talvez esteja vivendo por procuração através de uma pecadora [risos].
Há um monte de vídeos no YouTube de você tocando rock alternativo e clássico. Você alguma vez teve vontade de voltar a isso e fazer algo no estilo de Billy Joel?
Eu escrevi uma música assim para o álbum novo. É boa demais. E é muito pessoal. A música fala sobre a minha tristeza da maneira mais real e honesta possível, e fala sobre como o meu pai sempre foi o meu amigo nos momentos em que eu me senti mais insuportavelmente sozinha. Ele atendia aos meus telefonemas e ficava me ouvindo chorar e f alar da minha tristeza feito uma idiota, e ele dizia: "Sabe, Loop, você vai ficar bem se as suas músicas tocarem no rádio".
(O ônibus de turnê para em um hotel em Birmingham, onde a assistente de Lady Gaga embarca.)
Vou deixar você ir para Manchester. Obrigado pelo seu tempo.
Use as coisas que vão me transformar em lenda. Eu quero ser uma lenda. Será que isso é errado?
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